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7 de dez. de 2010

Coco Chanel & Igor Stravinsky

Considerada um dos maiores ícones da moda não apenas pela confecção de chapéus e criação de uma fragrância que lhe consagraria no ramo, mas também pelo guarda-roupa “ousado”, tingido de cores neutras pouco chamativas e sem apresentar traços essencialmente femininos. Foi cantando em bares e bórdeis que a jovem francesa Gabrielle Bonheur encantou um velho barão, que abriu as portas de sua mansão para a ambiciosa donzela seduzida pelos ares da burguesia francesa. Anos mais tarde, era justamente na alta sociedade da França que Gabrielle, depois popularmente conhecida como Coco Chanel, se estabeleceria. A fase anterior da jovem estilista até consolidar a sua marca é retratada no ótimo “Coco Antes de Chanel”, filme lançado em 2009, dirigido pela luxemburguesa Anne Fontaine e que trazia o talento e a doçura da atriz Audrey Tautou como a personagem-título. Neste “Coco Chanel & Igor Stravinsky”, a história parte do tórrido relacionamento amoroso entre o casal que batiza a obra. Ela, uma artista no auge de sua carreira, proprietária de uma luxuosa mansão – herdada do barão – e financeiramente independente. E Stravinsky, um famoso compositor russo que cede aos encantos da rica estilista e aceita a ajuda oferecida por ela – moradia e empréstimos em dinheiro – até sua situação ficar equilibrada.

Depois de uma peça teatral de sua autoria ser massivamente reprovada pelos espectadores, considerando-a “obscura” e “obscena”, Igor Stravinsky (Mikkelsen) se vê com a popularidade em baixa. Ao contrário do público conservador, Coco Chanel (Mouglalis) se interessa pela excentricidade da arte desenvolvida pelo russo e acaba se aproximando do artista. Ele não recusa o seu socorro e aceita passar alguns dias na mansão de Coco, ao lado da frágil esposa, Katarina (Morozova), e seu rebanho de filhos. Lá, entre os cômodos frios e silenciosos, a infidelidade impera e surge um lascivo romance entre eles, sem afeto ou sentimento, regido pelo puro prazer da carne.

Da mesma forma que o envolvimento do casal protagonista não apresenta nenhuma paixão, o filme em si é elegantemente frio. Talvez a história entre os amantes nem fosse suficiente para render um filme só para eles, já que o caso extraconjugal, a julgar pelo resultado do projeto, não passa de uma atração sexual atrelada à admiração mútua entre duas pessoas de renome. Propondo quase um exercício de incomunicabilidade com o espectador, o diretor holandês Jan Kounen realiza um trabalho mecânico e com pouca vibração. O filme tem fôlego no seu primeiro ato, a exemplo da ótima cena ambientada no interior do teatro – uma composição belíssima que responde perfeitamente ao desconforto que Kounen pretende transferir ao público –, mas depois o potencial que o filme apresentava se dilui no fastio que acompanha a história até seu decepcionante desfecho. A fragilidade de Kounen fica evidente nas cenas em que os personagens-título estão separados por algum compromisso e ele tenta externalizar a saudade e dependência um do outro naqueles momentos de solidão, utilizando o péssimo artifício de olhar para o relógio e ver como as horas não passam sem o amante, para cenas mais tardes, dá-lhe cenas de sexo e saciação carnal.

É um filme com partes muito gratuitas, sem alma, sem parceria. “Coco Chanel & Igor Stravinsky” não cativa o público por completo, não convida o espectador a ser o terceiro elemento de um ménage a trois, o que é decepcionante. Toma formas e estrutura novelescas e se torna enfadonho, quase assumindo um teste de paciência até chegar ao final. Embora o ritmo de tartaruga manca, o filme ainda exibe alguns preciosismos em determinadas cenas que merecem destaque, como quando Coco lê uma carta escrita pela mulher traída e esta logo aparece ao seu lado, como se estivesse recitando os versos no papel, ou até mesmo uma (das milhares) cena de sexo ardente em que a câmera está posicionada no teto do quarto e registra tudo de cima, descendo lentamente. São passagens isoladas que funcionam bem, mas é uma pena que só serve para sustentar um roteiro que não vai a lugar nenhum.


Mais conhecido por dar vida ao vilão de James Bond no excelente “007 – Cassino Royale”, o dinamarquês Mads Mikkelsen já provou ser um bom ator em outras obras, como no belo “Depois do Casamento” ou até no próprio filme já citado do agente secreto, mas aqui cria um personagem antipático e indeciso em que o roteiro não lhe oferece muitas alternativas, o que não lhe confere destaque maior do que é capaz. Interpretando a sua esposa, a desconhecida Yelena Morozova também é limitada pelo script, mas ainda injeta um pouco de compaixão nos olhares da personagem naturalmente sofredora com as puladas de cerca do marido. E, pra fechar o elenco, com chave de...gesso, temos a falta de expressividade e carisma da francesa Anna Mouglalis, que perdida em sua apatia, atua no piloto automático e não dá sequer um toque de interessante a uma das mulheres mais importantes de um segmento conceituado até hoje. Muito bonita, de fato, mas limitadíssima como atriz. Compará-la com o desempenho de Audrey Tautou no outro filme é uma diferença gritante e, se for pensar, até injusta.

Pouco inspirado e mais longo do que deveria ser, “Coco Chanel & Igor Stravinsky” é, na verdade, um grande novelão travestido de perfume francês. E não é Chanel n. 5, porque este eu já senti e é de qualidade.


NOTA: 5,0


COCO CHANEL & IGOR STRAVINSKY (Idem) França, 2009
Direção: Jan Kounen
Roteiro: Chris Greenhalgh, Carlo De Boutiny e Jan Kounen
Elenco: Mads Mikkelsen, Anna Mouglalis, Yelena Morozova, Natacha Lindinger e Grigori Manoukov

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Recebi de dois queridos amigos blogueiros mais um selo para o blog, o Prêmio Dardos.

São o Reinaldo Glioche, da Claquete, e Rodrigo Mendes, do Cinema Rodrigo. Dois dos melhores espaços da blogosfera cinéfila. Muito obrigado, meus caros!

As regras:

1 – Exibir a imagem do selo no seu blog
2 – linkar o blog pelo qual recebeu a indicação
3 – Escolher outros blogs para receber o prêmio dardos
4 – avisar os escolhidos

Portanto, repasso para:

- A Single Arte

- Dialogando Cinema

- Cine ao Cubo

7 comentários:

Cristiano Contreiras disse...

Seu texto vai de encontro com o que 'imagino' desse filme. Adoro "Coco Antes de Chanel", acho um filme precioso, ainda mais pela trilha de Alexandre Desplat que torna o desenvolvimento do filme ainda melhor, sem falar na Audrey.

Engraçado, mas já li em blogs diversos que esse “Coco Chanel & Igor Stravinsky” é superior à versão de Audrey, mas eu acho que não terei essa mesma opinião.

Confiro ele depois.

Abraço

chuck large disse...

Já assisti "Coco antes de Chanel" e apesar de ser bem 'maquiado' gostei do resultado final do longa, achei bacana. Agora ainda não vi este "Coco & Igor", mas verei brevemente!

[]'s,
sebosaukerl.blogspot.com

Reinaldo Glioche disse...

rsrs. Ótimo arremate. Pois é, ainda não vi esse filme, mas o trailer me passou impressões frias. Me pareceu um registro desestimulante e agora vc me convenceu. Digamos que continua fora da minha lista de prioridades.
Grande abraço!

Kamila disse...

Fico curiosa para saber porque os filmes só ligam a trajetória da Coco Chanel à dos homens com os quais ela se envolveu.... rsrsrsrsrsrs Enfim, este parece ser somente um filme regular...

Alyson Santos disse...

Receber o selo já é gratificante, mas vindo do seu Blog se torna uma honra. Sem pieguisse... é sinceridade mesmo. Obrigado. To na correria do final de semestre e mudança de setor no serviço, em breve voltarei a ativa.

Abraços e obrigado mais uma vez.

Cássio Bezerra disse...

Pôxa, vlw meu brother!
Só agora acessei a net, pq tava viajando...
Mas fiquei muito grato pelo teu reconhecimento!
Logo mais volto aqui para pôr as discussões em dia!;)
Grande abraço.
:)

Elton Telles disse...

CRIS: também gosto muito de "Coco Antes de Chanel", acho um filme m envolvente e que não perde a sua elegância. Desplat faz um excelente trabalho, assim como Tautou, grandiosa no papel. Comparar este com "Coco Chanel & Igor Stravinsky" é até desleal, porque o outro é infinitamente mais denso e proveitoso. Este aqui, é frio e parece calculado, além de enfadonho em muitas partes.


JAMES: Hey de concordar contigo. Apesar da eficiência, "Coco Antes de Chanel" é mesmo bem maquiadinho, romântico e talz, mas é muito bom. Não é como a maioria das cinebiografias chatas que temos aos baldes por aí.


REINALDO: haha, valeu pelo comentário, Reinaldo. É, não tenha muita pressa pra conferir mesmo e nem crie expectativas pq vc pode se decepcionar...


KAMILA: hahahah Kamila, boa observação.


ALYSON: vc merece, meu caro! o/


CASSIO: vc também merece. Valeu!


ABS A TODOS!