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25 de out. de 2010

The Runaways - Garotas do Rock

Em meados da década de 1970, período em que o cenário do rock era dominado por homens, cinco garotas de 15 a 17 anos abriram as portas para as mulheres se munirem de baquetas e guitarras elétricas na guerra pelos direitos iguais sobre os palcos. Nascia o The Runaways, considerada uma das principais bandas do punk rock e a pioneira da história da música composta exclusivamente por integrantes do sexo feminino. Amadoras e com pouca visibilidade de mercado, o quinteto acabou encontrando no famoso empresário Kim Fowley – que já trabalhou com bandas como Guns n’Roses, Mötley Crue, Frank Zappa, Kiss, Alice Cooper, dentre outros – a oportunidade de serem agenciadas por um profissional do ramo e unirem a vontade de gritar ao mundo suas composições feministas com uma forma de conquistarem a independência econômica. Ainda que a crítica especializada as considerassem um produto fabricado pela indústria cultural, nos quatro anos que permaneceram em atividade, o The Runaways lançou cinco álbuns, esgotavam casas de shows, fizeram turnês internacionais, lançaram singles que viraram hinos do rock n’roll e inspiraram diversas bandas femininas posteriormente como L7, Babes in Toyland, Hole, 7 Year Bitch, dentre outras. Por apresentarem uma trajetória tão conturbada, incluindo os preconceitos e a rejeição das rádios, o The Runaways é um verdadeiro paradoxo musical, já que conquistaram sucesso relâmpago estrondoso e também pela sobrevivência no tempo, já que carregam uma valiosa importância na música pela qual são reconhecidas até hoje.

Diante de tanta riqueza sobre trajetória da banda, chega a ser frustrante o caminho equivocado pelo qual a diretora e roteirista Floria Sigismondi preferiu percorrer. Escrito pela própria, a história de “The Runaways - Garotas do Rock” tem início em 1975, quando Joan (Stewart), de 17 anos, passa a maior parte do seu tempo nas ruas tocando violão com as amigas, interrompendo os acordes apenas para tragar seu cigarro sem filtro. Enquanto isso, Cherie (Fanning), de 15, fica se maquiando em frente ao espelho de seu quarto, remendando Ziggy Stardust, personagem criado pelo seu maior ídolo: David Bowie. Em uma festa, Joan conhece o famoso produtor musical Kim Fowley (Shannon) e o convence a apoiar seus dotes artísticos. Mais tarde, o futuro empresário contata mais algumas adolescentes para integrarem o grupo, dentre elas a recatada Cherie, e está formado o The Runaways. O filme acompanha a banda desde seu auge, com o lançamento do CD homônimo até a desintegração do quinteto, fruto de brigas internas e desentendimentos entre as integrantes.

Somando ao trabalho de direção pouco inspirado de Sigismondi – famosa como diretora de videoclipes -, o maior motivo para o semi-fracasso de “The Runaways” foi traçar uma versão muito comportada sobre os episódios mais adversos que comprometeram a carreira da banda. Afinal, o filme omite a dependência química das integrantes que quase acabou com o grupo, não mostra a recusa declarada da mídia por classificá-las como “rebeldes sem causa” imaturas e inconsequentes e, além disso, ignora totalmente a discriminação pela própria classe do rock, que descia em cima delas por se tratarem de garotas adolescentes inexperientes que tocavam enfurecidas no palco vestidas de lingerie. É claro que 105 minutos não seria suficiente para condensar todo o material que ronda a história da banda, mas certamente a biografia do The Runaways (e não só delas) exigia a reprodução fiel e sem retoques das dificuldades enfrentadas por todas. Ou o trabalho de pesquisa de Sigismondi para conceber o filme se resumiu ao Wikipédia ou simplesmente a diretora deveria dedicar os seus préstimos exclusivamente aos videoclipes.

à esq., as atrizes de "The Runaways"; à dir., as verdadeiras fugitivas

O roteiro do filme é terrivelmente preguiçoso e a impressão que passa é de que o The Runaways atingiu o estrelato em um estalar de dedos, pois acompanhamos o ensaio da banda em um trailer minúsculo, e na cena seguinte já vemos um show lotado, com pessoas cantarolando suas composições, além de várias revistas conceituadas estampando as garotas rebeldes na capa. Pouco depois, elas já estão em turnê internacional pelo Japão e tudo é simplificado, raso e com pouca substância. Sem contar o pobre desenvolvimento das personagens, de quem o espectador conhece o básico e mantém certo distanciamento involuntário fruto da incompetência do script mal desenvolvido. E devo mencionar aqui o beijo lésbico entre as protagonistas que virou uma ferramenta de marketing ferrenha para promover o filme, que, na verdade, revelou-se uma mera desculpa para fazer com que garotinhas sapecas fiquem se pegando e ainda colocar as famosas personagens da “Saga: Crepúsculo” em cenas ultra “picantes”. Comparado ao filme, a novela global das 8 é puro hardcore XXX.

“The Runaways” é um filme desperdiçado, mas nem por isso deixa de ser proveitoso em algumas passagens. Apesar de maquiar excessivamente a história, o filme possui ritmo e não empaca, e ainda compreende bem a filosofia “sexo, drogas e rock n’roll” que imperava os anos 70, vistas as apresentações, o figurino e a recriação da rebeldia enraizada nos locais. E se muitos duvidaram da interpretação das atrizes, ambas cumprem bem ao que pede o roteiro limitado, com maior destaque para Dakota Fanning, que como Cherie Currie e sua expressão blasé durante boa parte do filme, protagoniza uma cena que se passa no supermercado que merecia aplausos pela ousadia e desenvoltura, mas infelizmente trata-se de uma cena isolada do restante da projeção. Kristen Stewart troca o vampiro albino pelo cabelo estilo Chitãozinho e Xororó e convence como Jett, conferindo autenticidade à personagem. Mas as duas, talvez por inexperiência, perdem todo o brilho quando Michael Shannon está em cena. Beneficiado por um personagem irreverente e hilário em suas provocações, é na extravagância da atuação que reside os méritos do ator, roubando toda atenção para si.

No entanto, o esforço dos atores não faz de “The Runaways – Garotas do Rock” um filme recomendável, já que as arbitrariedades do roteiro e a maquiagem pesada na história impediram a evolução do filme, que não faz jus à trajetória conflituosa e sensacional da banda homônima.

Em uma palavra, Glenn Close resume a minha opinião sobre o filme:

NOTA: 5,0


THE RUNAWAYS – GAROTAS DO ROCK (The Runaways) EUA, 2010
Direção e Roteiro: Floria Sigismondi
Elenco: Dakota Fanning, Kristen Stewart, Michael Shannon, Scout Taylor-Compton e Riley Keough

9 comentários:

Reinaldo Glioche disse...

"Troca o vampiro albino pelo cabelo chitãozinho e xororó!" Ótima essa. Enfim, sem mais a declarar né? Ótima contextualização e puxada de orelha nos responsáveis por esse, como vc colocou, semi-fracasso.
Abs

pseudo-autor disse...

Eu não concordo muito, não! Achei um filme interessante. Acho que o grande problema de Runaways é que os fãs de Joan Jett e companhia ltda sempre foram do tipo "eu sei mais sobre o artista do que o próprio artista ou de quem fale sobre ele". E isso dificulta na hora de agradar qualquer público.

Cultura na web:
http://culturaexmachina.blogspot.com

chuck large disse...

Com certeza o filme deixou muuito a desejar em diversos aspectos, mas o roteiro mau explicado é o maior problema, ficou mesmo muito superficial e meteórico demais, sem contar que o foco ficou mesmo para Cherie Currie do que a própria banda.

Abs. =)

Cristiano Contreiras disse...

Hahahaha!

Você sempre divertido nos comentários ao criticar um filme, rs! Adorei a Glen Close no final, rs.

Eu acho que este filme deveria mesmo ter sido bem mais ousado, mas há bons momentos nele. A Kristen tá muito bem!

abs

Rodrigo Mendes disse...

Poxa, entao você me livrou de uma enrascada. Eu que queria tanto assistir! "Uó" coro a Glenn Close e ao seu texto divertidíssimo. Rs!

Abs.
Rodrigo

cleber eldridge disse...

Apesar dos muitos comentários medianos, estou um tanto curioso quanto ao filme.

Mayara Bastos disse...

Ainda não fiquei curiosa para assistir e ainda não sei o motivo. rsrsrs.

Beijos! ;)

Hugo disse...

Estava curioso para assistir ao filme, mas ao que parece a história real é mais interessante que a adaptação.

Estou linkando seu endereço no meu blog.

Abraço

Elton Telles disse...

Obrigado pelo seu comentário, Reinaldo =)


Pseudo: eu não sou grande fã da banda, nem de Joan Jett, mas gosto muito das bandas que elas influenciaram. No entanto, qualquer um que tenha o mínimo de informação sobre a história do rock, sabe que até elas alcançarem a fama, o The Runaways sofreu muito com preconceitos e até porque as próprias integrantes não facilitavam. E o filme mostra isso muito pouco, com pouca ênfase e isso acaba sendo frustrante.


Exatamente, Alan, o filme parece mais da Cherrie Currie do que do The Runaways. O roteiro é mal desenvolvido e se perde um pouco. No final, ficou um retrato particular e pessoal da diretora, e não como realmente foi. Embora a realidade seja subjetiva, mas enfim.


Hahhaha Cris, Close merecia este momento. Kristen Stewart está mesmo, mas como eu disse: o filme é vago, mas tem cenas que valem a pena, sim, como a própria bebendo vodka em uma arma de água rs.


Rodrigo: livrei mais um, então hahaha. Valeu pelo seu comentário, meu caro.


Cleber, Mayara e Hugo: assistam, mas sem sustentar expectativas. E se querem mesmo conhecer o The Runaways, vejam um documentário do VH1 que é muito mais proveitoso.


ABRAÇOS A TODOS!