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27 de ago. de 2010

Programa Cinema Falado - 27/08: Ghost World

Série de Agosto: Cinema Independente

Desde o início da década de 1980, é notória a instituição possivelmente ideológica de um padrão fixo para filmes com baixo orçamento nos Estados Unidos. Não é difícil enumerar algumas das principais características, mas esse detalhamento logicamente não é generalizado, alguns são mais ousados – ou mais covardes, depende do ponto de vista – e fogem à suposta “regra”. Portanto, deve-se ficar claro que nem todos os filmes underground norte-americanos repetem a mesma receita, que, por muitas vezes, resulta em pratos saborosos e nutritivos. Poucas das qualidades distintivas do cinema independente produzido nos Estados Unidos serão descritas durante o texto, enquanto discorro a respeito de uma ótima fita representante desse (ainda) seleto time de produções: “Ghost World”. Dirigido por Taylor Zwigoff, cujos filmes são marcados pela excentricidade, seu trabalho de estreia apresenta as amigas de infância Enid (Birch) e Rebecca (Johansson), recém-formadas do Ensino Médio, planejando o destino de suas vidas após a tão sonhada conclusão dos estudos. Nenhuma delas pretende fazer faculdade para não se deparar com os mesmos losers da escola, mas elas têm a intenção de trabalharem para pagar o aluguel do apartamento que pretendem dividir e eternizarem a amizade. No entanto, o relacionamento das duas entra em conflito a partir do momento em que Enid conhece Seymour (Buscemi), um amante da música tímido, solitário e com o dobro da idade da garota. O ciúme acaba sendo inevitável entre as amigas, mas a ruptura da amizade monótona entre elas acaba sendo um estepe para ambas darem passos largos na vida e aprenderem que viver é muito mais do que simplesmente andarem pelas ruas sem rumo e humilhar as pessoas por diversão.

História leve, agradável, sem a obrigação de um clímax sufocante no final; um mero retrato do cotidiano; cenas soltas que parecem deslocadas do conjunto; personagens excêntricos como protagonistas – esses, geralmente, são os “esquisitões” de filmes com apelo mais comercial –; uma dose econômica de humor; trilha sonora aplicada e convidativa, geralmente com bandas pouco conhecidas do grande público... Enfim, claro que isso varia muito de acordo com o gênero, mas são algumas peculiaridades que assentam o caráter do cinema independente que originou nos Estados Unidos – afinal, eles tinham mais recursos e investimentos –, mas já está dizimado entre as cinematografias de todo o mundo. O roteiro original e levemente bizarro foi reconhecido com uma indicação ao Oscar em 2002, mas é lamentável que as atuações foram esnobadas da premiação. Thora Birch e Scarlett Johansson retratam com espantosa naturalidade as protagonistas chatas, blasés e que não se esforçam em disfarçar a indiferença que sentem aos demais, enquanto o sempre ótimo Steve Buscemi injeta um pouco de humanidade ao filme com seu personagem calmo, recluso e compreensível. “Ghost World” é um filme agradável e sarcástico ao mesmo tempo, vale muito a pena porque foge da mesmice do cinema comercial. Se o início promete ao espectador acompanhar o tédio fulminante da vida das personagens centrais, aos poucos, notamos os sintomas de amadurecimento que afloram nas garotas, abordado pelo roteiro de forma sutil e sem alarde. Assim como a vida.

PROGRAMA CINEMA FALADO – 27/08, ÀS 20h30, AO VIVO
FILME EM CARTAZ: “GHOST WORLD” (2001)



Na semana passada...

Não deu tempo de escrever o texto da semana passada porque meus dias estão passando como horas, ultimamente. Na última sexta-feira (20), comentamos a ficção científica “THX-1138”, de 1971. No mínimo curioso uma ficção científica ser concebida com poucos recursos, mas a despeito dos efeitos visuais hipnóticos, o primeiro filme da prolífera carreira de George Lucas prima por uma história crítica, sagaz e pessimista em relação ao futuro. Confesso que fiquei surpreso ao conferir o filme, porque jamais imaginaria que o mesmo diretor da saga “Star Wars” pudesse conduzir um projeto tão autoral e inteligente como esse. Subestimei os esforços de Lucas e dei com a cara no chão; sem dúvidas, esse é o melhor de sua filmografia. Visivelmente inspirado em livros atemporais como “1984”, de George Orwell e “Admirável Mundo Novo”, de Aldous Huxley, “THX-1138” também estabelece um diálogo interessante com “2001: Uma Odisséia no Espaço”, clássico absoluto de Stanley Kubrick – aliás, uma sessão dupla com esses filmes renderia boas discussões. Questões como manipulação e alienação da sociedade e até a dependência dos seres humanos por aparatos tecnológicos concomitante com cenas de perseguição de tirar o fôlego, “THX-1138” é um filme riquíssimo tematicamente e apenas o seu conteúdo desafiador e pouco acessível à grande massa justificam o fracasso do filme na época. Sem dúvidas, é um achado! E se o leitor, assim como eu, achava George Lucas o mais frouxo e superestimado diretor da safra da “Nova Hollywood”, é hora de rever nossos conceitos.




O Cinema Falado é um programa semanal transmitido pela Rádio Universitária Cesumar. Atualmente na 5ª temporada, toda sexta-feira o trio de apresentadores cinéfilos – eu, Thiago Ramari e Marcelo Bulgarelli – seleciona um filme para que seja colocado em discussão, contanto que o escolhido se enquadre dentro da série mensal estabelecida pelos produtores. Tentando ser justo em abranger os diversos segmentos cinematográficos, o Cinema Falado não se restringe a filmes comerciais, nem aos considerados cult, pois tudo faz parte do mesmo balaio dessa arte que todos nós adoramos – uns mais que outros, mas viver de preconceito pra quê? Desde Bergman até Michael Bay, tudo que envolve o mundo do cinema é assunto para um papo descontraído e com muito bom humor. Para dar um toque especial, a trilha sonora do filme em questão acompanha a conversa de fundo e algumas canções/composições são ouvidas durante os intervalos.


O ouvinte é peça fundamental do programa, afinal a participação e interação de outros cinéfilos é deveras importante para buscarmos novos horizontes acerca do mesmo tema. Sinta-se livre para indicar os filmes e participe também do nosso programa.


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Só lembrando, as sessões semanais são às sextas-feiras, ao vivo, às 20h30.

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