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26 de jun. de 2010

Um Olhar do Paraíso


Na época do lançamento da trilogia “O Senhor dos Anéis”, havia os detratores do filme que acusavam, dentre outros aspectos, a utilização exacerbada e corrompida de efeitos especiais pelo diretor Peter Jackson. Muitos afirmavam que os filmes não passavam de uma grande experiência visual, consequente de um apurado trabalho técnico e que a presença de um diretor para conduzir a história era praticamente inexistente e até obsoleta, já que o computador era responsável por reger todo aquele espetáculo. Claro, uma opinião implausível e limitada. Se naqueles tempos, eu defendia com afinco a posição do diretor e rebatia qualquer crítica infundada que se deleitava na preguiça, futilidade ou no pseudo-intelectualismo, é com tristeza que reconheço: o novo trabalho de Jackson, “Um Olhar do Paraíso”, não passa de puro esteticismo. Passamos a compreender que o visual do filme é levado mais em consideração do que a própria história que pretende contar. O resultado é um show de imagens impressionantes e brilhantemente concebidas, mas que perdem o brilho quando percebemos que aquilo tudo não tem substância alguma, é um exercício estético puramente vazio.


Escrito pelo próprio Jackson, ao lado das colaboradoras habituais, Fran Walsh (sua esposa) e Philippa Boyens, “Um Olhar do Paraíso” se esforça em narrar a história de Susie Salmon (Ronan), uma garota de 14 anos que é brutalmente assassinada pelo vizinho misterioso, George Harvey (Tucci). O filme já inicia com uma narração da protagonista sobre o abandono involuntário daquele mundo, mudando-se para o Meio-Termo (um tipo de lugar fantasioso entre o céu e o inferno). No entanto, a adolescente, mesmo morta, é capaz de acompanhar os acontecimentos na vida real, e passa a testemunhar a perda do namoradinho para outra garota e a gradual desintegração familiar advinda da sua morte.

O filme é um bagunça, um circo. Por vezes, até ofende. Não li o livro de Alice Sebold – aqui no Brasil, intitulado “Uma Vida Interrompida – Memórias de um Anjo Assassinado” – e me pergunto: será que a autora aprovou o resultado? “Um Olhar do Paraíso” é recheado de cenas vergonhosas e dispensáveis, algumas chegam a quebrar completamente o ritmo e a atmosfera de tensão que era pretendido a certa altura do filme. Acontecimentos improváveis e de uma coincidência gritante apenas para ligar algumas personagens da trama – o que é uma tentativa frustrada, já que muitos personagens são completamente vomitados pelo roteiro. O que dizer da flor que volta a brotar ou um bilhete que voa a cidade inteira com a força do vento, mesmo que os cabelos dos personagens permanecem imóveis? Poderia enumerar uma lista de cenas exageradas e terrivelmente estúpidas.

Aliás, quantas vezes mais Jackson pretendia mostrar um flashback que trazia Susie andando em sua bicicleta ao mesmo tempo em que tirava fotos? E o mau desenvolvimento do filme, comprometido pelo péssimo trabalho de edição, também se dá por conta das tentativas de localizar o verdadeiro assassino da protagonista. Somos bombardeados por clichés intermináveis e identificamos certo desespero do roteiro em querer traçar o destino desses personagens, apelando até para o cachorro dos Salmons, que late incansavelmente ao ver o vizinho psicopata. E, como já comentei, o péssimo roteiro simplesmente joga algumas pessoas no meio da história, sendo que não tem importância alguma. O troféu abacaxi vai para Susan Sarandon, numa participação completamente irritante e desnecessária. Enquanto Mark Wahlberg e Rachel Weisz não vão muito longe devido às limitações do script, Saoirse Ronan – fisicamente, uma versão mirim da atriz Chloë Sevigny -, que já havia mostrado talento na sua curta participação em “Desejo e Reparação”, consegue desempenhar um trabalho eficiente, emprestando coragem à personagem, mas também afirmando que, embora seja uma garota confiante, não é imune à insegurança e ao medo. E chegamos ao vilão da fita, Stanley Tucci, que não fez absolutamente nada de mais para receber uma indicação ao Oscar deste ano. Está bem? Sim, cumpre o papel e não causa repulsa como Sarandon, mas sua menção na premiação é exagero.




Se algum departamento do filme merece reconhecimento no Oscar, eu arriscaria a bela direção de arte, cuidadosamente detalhada na composição de cenários belíssimos, acompanhadas com uma fotografia radiante, que remete a “Peixe Grande e Suas Histórias Maravilhosas”, do Tim Burton. É uma pena, porém, que Peter Jackson exagere nos efeitos visuais, atribuindo mais valor à estética do que ao produto em si. O trabalho de direção falha gravemente ao utilizar algumas passagens dignas de videoclipe ou quando tenta criar tensão no filme, apelando até para uma linguagem que parece mais de trailer do que outra coisa. Não demora muito a perceber ao longo (e bota longo nisso) dos 135 minutos de duração que o filme perde o ritmo e foco. Torna-se um programa cansativo e o bocejo é inevitável.


Engraçado que o filme é repleto de pessoas talentosas e competentes, mas que erraram feio nesse projeto. Além de Jackson e Sarandon, adiciono o trabalho do grande Brian Eno, cuja trilha sonora funciona em algumas cenas de fantasia, mas é nauseante na maior parte da projeção – e a cena do milharal com o taco de baseball é o ápice dessa (triste) realidade. Se alguém ainda discrimina Jackson pelo seu passado com o pé no cinema trash – os divertidos “Náusea Total” e “Fome Animal” – é porque ainda não foi torturado pela pieguice e futilidade de “Um Olhar do Paraíso”.



NOTA: 2,5


UM OLHAR DO PARAÍSO (The Lovely Bones) EUA, 2009
Direção: Peter Jackson
Roteiro: Peter Jackson, Fran Walsh e Philippa Boyens

Elenco: Saoirse Ronan, Mark Wahlberg, Stanley Tucci, Rachel Weisz e Susan Sarandon

8 comentários:

Beatriz Barbosa. disse...

NOTA: 2,5 ? Rs.
Sou apaixonada por esse filme!

Beeeijos.

Alan Raspante disse...

Estou pensando se encaro essa bomba..
UAHSUHHAUSUHA'

Francisco Brito disse...

Um dos piores e mais vergonhosos filmes a que já tive o desprazer de ver.

Cristiane Costa disse...

Excelente crítica. Bombardeou total, rs!

Mas confio totalmente no seu bom senso de cinéfilo. Acredita que não assisti este filme? Falta coragem, e dá até preguiça com um bom 'bocejo', rs!

Agora que vi sua crítica, estou pensando se coloco meu 'olhar no inferno' haha.

abs!

PS: é triste ver um elenco tão bom e um filme tão mal dirigido... coisas de Cine!

bruno knott disse...

De fato é um filme cheio de falhas, mas os poucos acertos que ele tem me foram suficiente para dar uma nota 6!

Talvez eu tenha exagerado. ;)

Abs.

Rodrigo Mendes disse...

Oi Elton.

Respeito sua opinião que é contundente. Mas faço coro a Beatriz..eu gostei, rs!

Tudo bem que o filme é prevível até para quem não leu o romance da Alice, imagino que deve ter sido um tanto frustrado para quem era leitor da obra.

Reconheço que é um filme menor e não muito brilhante do Peter (como Almas Gêmeas e os filmes trash no início da carreira - Náusea Total, Fome Animal e Os Espíritos), mas ele é redondinho e bem produzido.

Concordo contigo, que a estética é brilhante mais batida, no entanto, até nestas condições eu tive simpatia pelo filme. Gosto de histórias sombrias e enredos policiais. Embora este não tenha sido a premissa principal do filme.

Não gostei muito só do papel da Rachel e do Mark. Acho que a Susan Surandon rouba o filme, rs!

E o que me incomoda também, e vejo isso após rever o filme, é a frieza das personagens.

O Stanley Tucci faz um ótimo psicopata!

Enfim, acho que o Peter não conseguiu o mérito de voltar com uma fita pequena após os épicos Senhor dos Anéis e King Kong, mas como eu disse acho "Lovely Bones" regular e assistível. (não gostei da tradução em português- deveria ser mesmo literalmente Restos Angelicais e ou/ Ossos Angelicais), rs!

Abs.
Rodrigo

Mayara Bastos disse...

Realmente, com uma equipe tão boa, esperava-se mais, mas não achei de um todo ruim, porém, tive problemas com o roteiro. Salva-se as atuações de Saoirse e Tucci e o trabalho da fotografia.

Um 6,5, vai de bom tamanho. rsrsrs

Beijos! ;)

Elton Telles disse...

Olá Beatriz.
Obrigado pela visita ;)
2,5 porque fui até condescendente com o Peter Jackson. Acho que "Um Olhar do Paraíso" é seríssimo candidato a um dos piores filmes do ano. Brincando.


Alan, é complicado. Embora tenha todos esses defeitos, ainda acho que "Um Olhar do Paraíso" pode virar um cult no futuro. Claro, um "cult maldito", já que tem todos os ingredientes, menos o essencial rs. A propósito, Peter Jackson já é um símbolo cult, então. Assista ao filme, mas com os 2 pés atrás.


Francisco: hahahaha! Realmente, o filme é uma tortura. Acho pouca coisa destacável da fita.


MaDame: trocadalho do carilho! Hahahaha! Muito bom! Valeu pelo seu comentário. "Um Olhar do Paraíso" desperdiça mesmo um grande elenco com uma história bagunçada e que parece que não tem um diretor regendo tudo. Uma grande bagunça, infelizmente.


Bruno: algum de nós exagerou, eu acho xD


Hey Rodrigo! o/
Eu achei o filme bem bagunçado, pra ser sincero. E triste que Jackson não se resolve em que focar. A história se perde e não há ressonância alguma com a vivência da garota no "paraíso" com seus pais na Terra.

De fato, Weisz e Wahlberg foram muito desperdiçados, mas Susan Sarandon é a persona mais irritante! A cena que ela joga um vaso de flores no fogão eu quase me retirei do cinema rs. Puta personagem idiota, estúpida! Concordo contigo quanto ã frieza e distanciamento dos personagens. Stanley Tucci está bem no início, mas depois se transforma em um vilão ultra caricato.

Sem dúvidas, esse representa o patinho feio da filmografia bem sucedida de Jackson. Mas todos sabemos... os grandes também erram =)


Mayara: Alaido ao roteiro, achei que Peter Jackson perdeu a mão totalmente. Assim como você, destaco Saoirse Ronan e a fotografia. Stanley Tucci... hummmm...not! =D


ABS!